Sujeitos, sentidos, interações: a comunicação como fundamento da cultura

Por: Roberto Almeida
Introdução
A partir do início do século XX, os meios de comunicação de massa passam a ocupar um papel cada vez mais central no cotidiano das pessoas. Nessa época, o acesso à educação e à alfabetização, pelo menos nos países mais ricos, começa a se universalizar. A imprensa escrita (jornais, revistas, folhetins, etc.) vive um processo de profundas transformações e passa a ser consumida por um número cada vez mais ampliado de indivíduos. Ainda na década de 10, as primeiras emissões de rádio são feitas nos Estados Unidos. Nos anos 30, a torre Eiffel passa ser usada para emitir sinais televisivos, para a França e a Alemanha[1]. No mesmo período, é celebrado o trigésimo aniversário da invenção do cinematógrafo.
Com o tempo, esses meios de comunicação se popularizam e passam a oferecer às pessoas, em diferentes partes do mundo, informação e entretenimento. Ao mesmo tempo, são apropriados para fins ideológicos e mercadológicos. O rádio, a TV, o cinema e imprensa são explorados com objetivos publicitários e para propagandear visões de mundo as mais diversas. Os tempos eram propícios: o capitalismo, tal qual o conhecemos, se consolidava. Era necessário fazer com que girassem as rodas do comércio e da transação de bens de consumo. Do mesmo modo, no contexto da II Guerra Mundial e da subsequente Guerra Fria, o enfrentamento do inimigo – fossem eles nazistas, capitalistas ou comunistas – dependia sempre do apoio das massas. A sobrevivência dos Estados e o enfrentamento das tensões geopolíticas estavam ligados, portanto, à conquista dos “corações e mentes” da população. As máquinas de guerra não eram, pois, exclusivamente militares: eram, também, comunicacionais.
Nesse contexto, a comunicação social começa a surgir como um campo de pesquisa. Estudiosos das mais diversas áreas (sociologia, psicologia, ciência política, dentre outros) passam a incluir o estudo desse fenômeno em seus programas de pesquisa. De fato, compreender como a mídia afetava as visões de mundo das pessoas, estimulava processos de compra e a difusão de ideologias era uma preocupação recorrente, que impulsionou a criação de diferentes centros de estudo e investigação acadêmica.
Do início do século passado até os dias de hoje, a importância da mídia em nosso cotidiano cresceu enormemente. A preocupação de estudiosos e de pessoas comuns com o tema testemunha isso. Como a mídia afeta o processo de formação e socialização de nossos filhos e alunos? Como ela interfere nas decisões de voto do cidadão? A violência, diuturnamente exibida no cinema e na TV, contribui para forjar uma juventude mais violenta? Como os meios de comunicação afetam a relação de meninos e meninas com o corpo e a sexualidade? Como a mídia toca os processos de formação identitária, de tomada de consciência política, de participação cidadã? São várias as questões e dúvidas que temos nesse universo e, infelizmente, nem sempre definitivas as respostas que conseguimos obter.
Este texto não pretende solucionar de forma cabal as perguntas elencadas acima. Antes disso, se propõe tão somente a discutir o conceito de comunicação e sua relação com a cultura. Como os valores, as normas e os pontos de vista disseminados em nossa sociedade são afetados pelos fluxos discursivos (mensagens, textos) da mídia? O que é a cultura e como ela se faz e refaz no contato cotidiano dos sujeitos (leitores, espectadores, ouvintes, internautas) com os produtos midiáticos?
Essa discussão marca o início do primeiro módulo do curso. Representa um ponto de partida para os debates que faremos mais adiante, sobre a natureza do sistema midiático, sobre sua relação com as culturas juvenis e sobre a função educativa da comunicação social.
Para iniciar nossa reflexão, proponho uma questão extremamente simples, mas igualmente desafiadora: Comunicação. O que é isso?
A comunicação em uma perspectiva relacional
Etimologicamente, a palavra comunicação vem do latim communicatio, ato de repartir, de distribuir, tornar comum. Liga-se também a ideia de communis: público, geral, compartido por vários. É parente, portanto, do termo comunhão[2].  A ideia de partilha (de sentido, de ideias, de pontos de vista), está implícita, portanto, na própria origem do termo. Para além de sua base etimológica, no entanto, o que significa falar em comunicação?
Existem diferentes respostas para essa mesma pergunta. Coisa natural, uma vez que a comunicação é um fenômeno tão antigo quanto a própria humanidade: desde sempre as pessoas se comunicam, estabelecem acordos, divergem em seus pontos de vista, trocam informações e opiniões. Diante dessa diversidade, assumimos, neste texto, uma abordagem específica, que caracteriza a comunicação como um fenômeno relacional.
Essa interpretação diverge, de modo frontal, de outra, que trata a comunicação com um simples processo de transmissão de informações. Filiada ao chamado paradigma matemático[3], essa corrente reduz as atividades comunicativas a um movimento de difusão de mensagens de um emissor para o um receptor. Ao primeiro, cabe a função de elaborar e transmitir um conteúdo. Ao último resta a tarefa de decodificar e compreender a mensagem transmitida. Nessa abordagem, a ideia de eficácia é central: a comunicação é eficiente se, e apenas se, o emissor conseguir produzir junto ao receptor as mesmas representações e imagens que ele tinha em mente quando deu início ao processo comunicativo. Vemos aí o ideal da comunicação transparente, livre de ruídos e das tensões (divergências) típicas do contato entre humanos. A comunicação seria bem sucedida, apenas, se o emissor conseguisse fazer com que o receptor visse, imaginasse ou pensasse aquilo que ele desejava transmitir.
Essa abordagem padece de inúmeras limitações. Ela trata a comunicação como um processo estático, mecânico e linear, reduzindo-a a uma mera dinâmica de condução de conteúdos: mensagens seriam transportadas de um ponto A (o universo da emissão) para um ponto B (o universo mental e cognitivo dos receptores). Além disso, o chamado paradigma matemático tende a desconsiderar o papel dos sujeitos nas trocas comunicativas. Falar em sujeitos significa falar em ação, em resistência, em apropriação e criatividade. Mensagens ou textos não são um pacote fechado de ideias e sentidos: antes disso, são conteúdos com os quais os indivíduos interagem ativamente, criticando-os, reinventando-os, propondo diferentes interpretações. Ao contrário do que frequentemente se supõe, receptores não são um página em branco ou recipiente vazio no qual os emissores inserem conteúdos. Se eles são sujeitos, eles inventam, resistem, criticam, propõem e refazem os textos com os quais se confrontam na TV, no rádio, na internet, no cinema ou nas interações face a face.
Outro problema associado ao paradigma matemático, diz respeito ao fato de que ele deixa de lado (ou não aborda de forma direta) uma dimensão central envolvida em todo processo comunicativo: a cultura. A dinâmica comunicativa não envolve apenas os sujeitos interlocutores, que trocam entre si mensagens e conteúdos. Ela toca também um universo maior, que a conforma e precede: universo da cultura ou o terreno do instituído (FRANÇA, 2003; QUÉRÉ, 1982). As palavras que dizemos – as imagens que a TV constrói, as opiniões que os jornais emitem, etc. – não são referências de sentido isoladas ou destacadas do mundo. Nossa palavra nunca é inaugural, nem exclusivamente nossa, no sentido de que ela sempre responde ou dialoga com concepções de mundo (com palavras) que já foram formuladas e que são por nós reproduzidas, tensionadas, criticadas, atualizadas. No dizer de Bakhtin (1992), filósofo da linguagem de tendência marxista, as palavras e os textos são dialógicos: eles carregam em si os ecos de outras palavras, mentalidades, ideologias. Nesse sentido, para o autor, a palavra está sempre encadeada a outras: delas provêm e a elas responde.
Mas como, na prática, esses outros textos se insinuam nos diferentes textos que circulam em nossa sociedade – no rádio, na TV, nas conversas informais, na internet? Tomemos como exemplo o debate jornalístico sobre um tema polêmico, como a descriminalização do aborto. Os jornais, em diferentes meios, divergem sobre o assunto (assim como os diferentes grupos de interesse em nossa sociedade). Cotidianamente, lemos artigos que tomam partido de um ou outro lado do debate: argumentos “pró-vida” se contrapõem a argumentos “pró-escolha”, em uma luta tensa, que frequentemente envolve as esferas jurídica e da política institucional, além das instâncias midiáticas. Nos argumentos dos grupos perfilados em cada um dos lados, podemos perceber os ecos de outras palavras, de visões de mundos já instituídas, que conformam e ultrapassam os textos que lemos nas páginas do jornal ou assistimos em um editorial de TV. Nas palavras daqueles que são contra a descriminalização do aborto, podemos, por exemplo, ver de relance fragmentos de discursos médicos e também de discursos religiosos: palavras e modo de pensar gerados em outros tempos e lugares se insinuam em seus argumentos e são, por esses sujeitos, repetidos, reformados, atualizados aqui e agora. Da mesma forma, no discurso do jornalista ou do militante pró-descriminalização do aborto, outros discursos se insinuam: novos (e diferentes) fragmentos do discurso médico, referências aos direitos humanos e aos direitos das mulheres, concepções de mundo e de vida forjadas ao longo de décadas de lutas das diferentes gerações feministas.
O que esse exemplo pretende demonstrar é que no tratamento desse tema sensível – a descriminalização do aborto – os agentes midiáticos e cidadãos envolvidos no debate colocam em movimento mais do que a discussão sobre uma questão meramente legal – o direito ou não de a mulher optar pela interrupção de uma gravidez. Essas interações comunicativas dizem respeito a normas e valores instituídos em nossa sociedade, aos deveres e direitos das mulheres, às formas de ver e conceituar a maternidade. Debatendo o aborto, os sujeitos interlocutores constroem consensos e tornam explícitos os dissensos. Nesse movimento, renovam e atualizam princípios e preceitos éticos (dados culturais) vigentes na nossa sociedade.
Dessa forma, a cultura e os discursos instituídos configuram e pré-determinam as intervenções comunicativas (a palavra, os argumentos) de agentes pró-vida e pró-escolha. Ao mesmo tempo, a intervenção pública desses atores (a manifestação de seus diferentes pontos de vista) retroage sobre a cultura, afetando-a de volta, numa relação cíclica, de afetação mútua. A cultura configura todos os nossos gestos expressivos e é, também, configurada e renovada por eles. 
A comunicação, em uma perspectiva relacional, é tratada, portanto, como o processo básico de fundação da nossa realidade. Em diálogo (nas trocas comunicativas) os sujeitos se afetam uns aos outros, influenciando-se e constituindo-se reciprocamente. Da mesma forma, a comunicação afeta a própria cultura: é no curso das interações que valores, normas e as ideologias se configuram, disseminando-se, adquirindo legitimidade.
A comunicação é, portanto, uma dinâmica transformadora. Em comunicação (no contato com o outro e com os textos e imagens que circulam no mundo) aprendemos a ser o que somos, nos transformamos, configuramos nosso entendimento sobre a realidade. Nesse processo, a própria cultura é fundada. Falar em comunicação significa, portanto, falar em movimento, falar na atualização das identidades dos sujeitos e da individualidade das coisas do mundo. Onde há dogmas e cristalização não há comunicação. O mundo, nossas e crenças e saberes só permanecem inalterados se o diálogo e a troca entre os seres humanos forem interrompidas.  
Cultura e comunicação
Até o momento, ficou claro para nós que é a comunicação, em seus múltiplos processos de debate e diálogo, que move a roda da cultura. Como podemos, no entanto, caracterizar o conceito de cultura?
Para Norbert Elias (1994), o século XVIII marca o período de formação do sentido moderno da palavra Cultura. Já nesse momento, a noção era associada à ideia de cultivar e à concepção correlata de “cuidado”. Cuidado, com a terra, com o gado, com o campo. Daí a ideia de cultivar abelhas, trigo ou uvas.
Com o passar do tempo, ao longo do setecentos, o termo passa a ser emprego empregado também uma acepção figurada. De acordo com Denys Cuche (2002), ele é associado a esse sentido, pela primeira vez no Dicionário da Academia Francesa, de 1718: fala-se em cultura do espírito, das letras e das artes (CUCHE, 2002). Assim, aos poucos, no pensamento iluminista, o termo passa a se contrapor à ideia de natureza: ao homem culto e educado se opõe espíritos naturais e “sem cultura”.
Nesse momento, balizado pelo ideário do iluminismo, o conceito de cultura carrega um acento fortemente universalista. No século XVIII, salienta Denys Cuche, “a cultura é sempre empregada no singular, o que reflete o humanismo e o universalismo dos filósofos: a cultura é própria do Homem (com maiúscula), estando além de toda distinção de povos e de classe” (2002, p.21). A ideia é associada às noções de progresso, de evolução e de civilização, conceitos que são entendidos como antídoto para a superação de estado de selvageria em que viviam povos de diferentes partes do mundo. Claro está que a noção de cultura desse momento é francamente anti-relativista: a cultura é pensada no singular e o processo civilizacional segue uma direção única: aquela que é definida pelas classes de elite de da Europa Ocidental.
Com o tempo, essa concepção universalista e etnocêntrica de cultura perde espaço no campo das ciências sociais. Na passagem do século XIX para o século XX, correntes evolucionistas passam a perder espaço para abordagens relativistas no campo dos estudos antropológicos: advoga-se, então, que não existe cultura, mas sim culturas (no plural) e que a formas de ser e de existir, uma vez que são humanas, são inevitavelmente variadas.
Essa transformação representa uma inequívoca evolução na forma de pensar a cultura. Mesmo assim, no século XIX, ganham força as formulações que identificam esferas rebaixadas e elevadas de cultura. Recorrentes, até mesmo nos dias de hoje, essas concepções distinguem a alta da uma baixa cultura, tratando-as como esferas separadas por uma ordem hierárquica específica. À alta cultura – a cultura culta, das grandes obras e dos saber especializado, ligado àquilo que de “melhor” e mais “elevado” o pensamento humano conseguiu produzir – se oporia uma cultura menos sofisticada, mais pobre do ponto de vista estético e, portanto, mais adequada ao gosto das massas.
Esse tipo de raciocínio, frequente ainda hoje nas páginas nos jornais, em conversas informais, no discurso de especialistas, carrega um forte sentido elitista. A separação entre alta e baixa cultura não aparta apenas domínios distintos da arte e das formas de expressão simbólica. Ela hierarquiza também, os próprios homens, separando os melhores (os mais educados, ilustrados e sofisticados) dos piores (aqueles que, por razões as mais diversas, são menos letrados ou não partilham dos gostos e das preferências estéticas de uma suposta “elite cultural”). Para Raymond Williams (2004) , o surgimento dessa diferenciação entre alta e baixa cultura, no curso dos séculos XIX e XX foi uma reação das elites europeias à “anarquia social” identificada a partir da Revolução Industrial e do surgimento das democracias modernas. Na medida em que, nos países mais desenvolvidos, a ampliação do acesso à educação e a melhora das condições de vida dos trabalhadores conduziu a uma lenta e sensível diminuição das diferenças de classe, a identificação de extratos culturais superiores e inferiores foi uma forma de conservar hierarquias históricas, que separavam as elites do povo.
O mesmo Raymond Williams -- que nos anos 60 do século passado contribui decisivamente para o surgimento dos Estudos Culturais[4] -- propôs uma conceituação de cultura francamente oposta a essas noções elitistas. As clivagens de cunho conservador tendiam a tratar a dita alta cultura como a única efetivamente legítima, como se a “verdadeira” cultura fosse posse exclusiva das intelectuais e de camadas específicas dos grupos dominantes. Em oposição a essa abordagem, Williams defendia um conceito neutro de cultura, desassociado de distinções hierarquizantes. Para o autor, a cultura não é privilégio de uma classe. Antes, é indissociável de tudo aquilo que é humano. No contexto britânico dos anos 1960, o autor percebe que os pobres e os trabalhadores cultivam formas de expressão cultural próprias, dentre as quais se destacam não só manifestações artísticas específicas, mas também experiência de classe relevantes, como formas particulares de solidariedade em bairros operários, tradições associativistas e de formação de sindicatos. Dessa forma, ele defende transformações conceituais relevantes: a cultura não deve ser hierarquizada, nem tratada como “posse” de grupos específicas. Ao mesmo tempo, deve ser pensada como algo que transcende e ultrapassa (embora inclua) o universo da arte e da criação estética.   
Na lógica dos Estudos Culturais, a cultura passa a ser pensada como algo dinâmico. Ela é entendida como o processo no qual os significados (as ideias, as opiniões, as visões de mundo) são socialmente produzidos e historicamente transformados (WILLIAMS, 2004). Caracterizada como processo, a cultura passa a ser entendida em sua natureza móvel. Ela se transforma historicamente: os conceitos, as crenças, as ideologias e os valores instituídos em dado momento alteram-se com o passar do tempo, no curso da ação social dos sujeitos[5]. É essa ação social (partilhada, coletiva) que afirma e institui a cultura. Deslocada do domínio exclusivo das artes, a cultura passa a ser vista como prática: algo que os sujeitos produzem, reproduzem e atualizam em seu cotidiano.
Reencontramos aqui as proposições apresentadas anteriormente, quando discutimos a  natureza relacional da comunicação. Se, como defende Raymond Williams, a cultura é construída a partir das práticas das pessoas comuns, devemos assumir que essas práticas têm um fundo inerentemente comunicacional. Em diálogo (em interação) homens e mulheres constroem o mundo no qual vivem, as referências normativas e os valores que orientam sua vida concreta.
Naturalmente, esses processos de diálogo não são livres de dissenso, tensões e conflitos. Lembremos, por ora, do exemplo apresentado acima, a respeito do debate sobre a descriminalização do aborto. De fato, Raymond Willians (2004) caracteriza a cultura como um terreno de disputas. Nessa arena, pessoas e grupos discutem a suas crenças, buscam fazer prevalecer seus pontos de vista, contribuem para construir o mundo e as ideologias vigentes em determinado tempo. Nessa luta, as armas são as ideias, materializadas em textos (a fala, as imagens, os livros, os filmes, os programas de TV). Nesse sentido, a comunicação coloca em causa um poder: o poder de fundar e transformar a cultura, ou seja, de fundar e transformar “verdades”, nossas formas de ver, nossos modos de ser e de agir no mundo[6].
Considerações finais
Ao longo do texto, discutimos o conceito de comunicação, contrapondo dois paradigmas distintos: o matemático (ou informacional) e o relacional, que percebe a comunicação com instância de fundação da identidade dos sujeitos e das referências culturais compartilhadas. Discorremos ainda sobre o conceito de cultura e sobre algumas das transformações pelos quais ele passou ao longo do tempo, assumindo, por fim, na esteira dos Estudos Culturais, que a cultura é um processo, um conjunto de referências simbólicas potencialmente transitórias, construídas pelas trocas comunicativas.
Nesse sentido, fica claro que a comunicação social tem uma dimensão educativa, ligada à formação dos sujeitos e à constituição de seus modos de ver e de ser no mundo e, por conseguinte, de sua condição de intervir e transformar a realidade. É no contato (interação) com o outro (nosso pais e nossos filhos, nossos professores, alunos e concidadãos) que aprendemos a ser quem somos e que nos atualizamos e nos refazemos como pessoa: figura humana entre outras. Da mesma forma, no contato cotidiano com os textos da mídia (com as notícias que lemos, com os filmes que assistimos, com o que vemos na TV ou ouvimos no rádio), refazemos nossos pontos de vista e nossos entendimentos sobre o mundo. Para o “bem” ou para o “mal”, mídia e comunicação educam. Daí a necessidade do cultivo de um espírito crítico e vigilante, bem como da permanente discussão daquilo que o sistema midiático – essa voz onipresente e sempre audível – nos oferece.
A humanização do mundo e dos homens, no sentido indicado por Paulo Freire (2006)  – no qual a ideia de humanização se liga à possibilidade de permitir ao ser humano ser mais, em uma acepção democrática e libertadora – passa por processos de diálogo e interação. É em comunicação que construímos a nós mesmos e construímos o mundo, sedimentando as bases do futuro e das transformações possíveis e desejáveis da realidade. O mundo e as pessoas afetam-se mutuamente, construindo-se e transformando-se de forma recíproca, colocando em movimento o cotidiano e a história.  

[2] Disponível em http://origemdapalavra.com.br/palavras/comunicacao/. Acesso em 27/07/2012.
[3] A esse respeito, ver Weaver (1971).
[4] Os Estudos Culturais não são uma disciplina, mas um campo interdisciplinar do conhecimento, de base marxista, surgido na Inglaterra dos anos 1960. Questões relacionadas à dialética entre cultura e sociedade e à relações de dominação e resistência no âmbito da cultura e dos conflitos de classe faziam parte das preocupações centrais dos pesquisadores inicialmente filiados a essa corrente de estudos. Nas últimas quatro décadas, os Estudos Culturais passam por um processo diaspórico, se espalhando por diversas partes do mundo, como os Estados Unidos, a Austrália, o Brasil e a América Latina. A esse respeito, ver Escosteguy (2006).    
[5] A natureza histórica da cultura é algo que o próprio senso comum atesta: pensemos no sexo e no maternidade fora do casamento. Ao contrário do que ocorre hoje, ser mãe solteira no Brasil dos anos 1950 era algo escandaloso e moralmente inadmissível. A história dos nossos tabus exemplifica, tipicamente, a natureza histórica, portanto móvel da cultura.
[6]Várias formas de poder coexistem em sociedades complexas como a nossa. Acima, falamos sobre uma delas, o poder simbólico. Ao lado dele, existe também o poder econômico, militar, o político, dentre outros. Antes de se excluírem, esses diferentes tipos de poder estão imbricados e contribuem para organizar as relações na intricada rede que constitui a vida coletiva no mundo contemporâneo. A respeito desse tipos de poder, ver Thompsom (2005). 
Referências Bibliográficas
BAKHTIN, M.. Marxismo e filosofia da linguagem. Tradução Michel Lahud e Yara Frateschi Vieira. São Paulo: Hucitec, 1992.
CUCHE, D. A noção de cultura nas ciências sociais. Tradução de Viviane Ribeiro. BAURU: Edusc, 2002.
ELIAS, N. O Processo Civilizador: uma história dos costumes. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1994
ESCOSTEGUY, A. C. Estudos culturais: Uma introdução In SILVA, T.T. (org) O que é, afinal, Estudos Culturais? 3.ed., Autentica, 2006 Belo Horizonte
FRANÇA, V. L. Quéré: dos modelos da comunicação. Belo Horizonte. Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da UFMG, 2003. Mimeo.
FREIREPExtensão ou comunicação?. 13. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2006
QUÉRÉ, L. Des miroirs équivoques - Aux origines de la communication moderne. Paris: Albier, 1982.
THOMPSON, J. B. A mídia e a modernidade: uma teoria social da mídia. Petrópolis: Vozes, 2005.
WEAVER,W. A teoria matemática da comunicação. In: COHN, G. Comunicação e indústria cultural. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo - Companhia Editora Nacional, 25-37, 1971. 
WILLIAMS, R. Cultura e sociedade. São Paulo: Nacional, 2004.

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